terça-feira, 5 de abril de 2011

COMO SURGIU O PIG (PARTIDO DA IMPRENSA GOLPISTA)

Os golpes da mídia

 

A possibilidade de ser instalada no Brasil uma comissão da verdade para contar o que aconteceu durante a ditadura militar, começada em 1964, aterroriza os setores conservadores. Tenho recebido pilhas de e-mails com o objetivo de mostrar que o golpe foi apoiado pelo povo. Estudei muito, ao longo dos anos, o processo que levou ao regime militar. Li centenas de livros. Convivi com intelectuais de esquerda que experimentaram o exílio, como Décio Freitas. Sempre soube de algo que agora parece surpreender as pessoas: a grande imprensa da época apoiou a rasteira dada em João Goulart. O golpismo da mídia chegou ao cúmulo de transformar a ditadura em democracia. Jornal do Brasil, O Globo, Folha de S.Paulo, Estadão, Correio da Manhã, revista O Cruzeiro, O Dia, todos fecharam com os militares e com o golpe "democrático".

O Globo foi um dos mais vergonhosos apoiadores da ditadura. Em editorial, que recebi seis vezes na última semana, o jornal de Roberto Marinho vibrou: "Ressurge a democracia". E cometeu este parágrafo digno de figurar numa história nacional da infâmia: "Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os patriotas, independentemente de vinculações políticas, simpatias ou opinião sobre problemas isolados, para salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas, que obedientes aos seus chefes demonstraram a falta de visão dos que tentavam destruir a hierarquia e a disciplina, o Brasil livrou-se do governo irresponsável, que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e tradições". Dias gloriosos? Até parece texto de humor.

A Folha de S.Paulo, que, não faz muito, chamou o regime militar de "ditabranda", exultava em 1964: "É cedo para falar dos programas administrativos da Revolução. Mas é incontestável que um clima de ordem substituiu o que dominava o país, onde nem mesmo nas Forças Armadas se mantinham os princípios de rígida disciplina hierárquica que as caracterizam". O Correio da Manhã batia na mesa: "Basta! Não é possível continuar neste caos em todos os setores. Tanto no lado administrativo como no lado econômico e financeiro". O Estado de S. Paulo beijava as botas dos generais. A revista O Cruzeiro, a Veja da época, do cangaceiro Chatô, dava voz aos que, como Carlos Lacerda, soltavam coices: "O Sr. João Goulart é um leviano que nunca estudou - e não estudou porque não quis, não é porque não pôde. E agora, no governo do país, queria levar-nos ao comunismo".

Tudo se repete. Inclusive os e-mails. As conclusões é que são diferentes. Nossa mídia adora contar que resistiu à censura com poemas e receitas de bolo no lugar dos textos proibidos. A verdade é que, primeiro, ela caiu de quatro. Deve ser por isso que a maioria dos jornais considera uma comissão da verdade inadequada e radical. Raul Ryff, secretário de imprensa de Jango, nunca teve dúvidas: "O golpe foi dado contra nossos acertos e não contra nossos erros". Jango havia cometido o erro de dizer isto: "Espero que, em menos de 60 dias, já comecem a ser divididos os latifúndios de beira de estrada".

Juremir Machado da Silva | juremir@correiodopovo.com.br

Correio do Povo

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