quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Intelectuais italianos a favor dos imigrantes


Intelectuais italianos, liderados por Dario Fo, Antonio Tabucchi, Andrea Camillieri, Giani Amelio, Dacia Maraini, Wu Ming e 34 outros mil, lançaram manifesto na defesa dos imigrantes: "Em virtude de uma decisão política, vinda de uma maioria efêmera, as crianças nascidas de mulheres estrangeiras em situação irregular serão durante toda as suas vidas filhos de ninguém. Elas serão tiradas de suas mães e colocadas nas mãos do Estado. Nem o fascismo foi tão longe".

Emir Sader, para Carta Maior

O Senado italiano aprovou a uma lei sobre segurança e a imigração, que cria o delito de imigração clandestina passível de uma multa de até 10 mil euros além da expulsão imediata. A estadia nos centros de detenção para estrangeiros em situação considerada irregular poderá chegar a 6 meses, ao invés dos 2 meses de hoje.

A nova lei torna obrigatória a apresentação de uma permissão de estadia ou de um passaporte para declarar o nascimento de uma criança para seu registro civil. A lei visa principalmente cerca de 500 mil mulheres imigrantes que trabalham como empregadas domésticas.

Intelectuais italianos, liderados por Dario Fo, Antonio Tabucchi, Andrea Camillieri, Giani Amelio, Dacia Maraini, Wu Ming e 34 outros mil, lançaram manifesto na defesa dos imigrantes:

“À cultura democrática européia e aos jornais que a expressam:

As coisas que acontecem na Itália sempre tiveram, para o bem e para o mal, uma influência extraordinária sobre toda a sociedade européia, desde o Renascimento italiano até a era do fascismo. Mas essas coisas nem sempre foram conhecidas a tempo.

Neste momento os jornais europeus estão muito atentos a alguns aspectos da crise que afeta o nosso país. Nós estimamos, no entanto, que é dever de todos nós que vivemos na Itália atrair a atenção da opinião pública européia sobre outros aspectos ignorados. Trata-se de certas iniciativas políticas e legislativas italianas que, se não logramos nos contrapor-nos a elas, arriscam de desfigurar a fisionomia da Europa e fazer recuar a causa dos direitos humanos no mundo inteiro.

O governo Berlusconi, invocando a segurança, impôs ao Parlamento, sobre o qual ele exerce um controle absoluto, a adoção de medidas discriminatórias em relação em relação aos imigrantes como as que vimos na Europa desde a época das leis raciais.

O objeto passivo da discriminação mudou. Não se trata mais dos judeus, mas dos imigrantes em situação irregular , isto é, centenas de milhares de pessoas. As disposições previstas pelas leis raciais, como a proibição dos casamentos mistos, não mudaram. Por essa proibição, impede-se, por critérios de nacionalidade, o exercício de um direito fundamental, como é o de se casar sem interdições de tipo étnico ou religioso. Um direito fundamental que se tira não apenas de estrangeiros, mas também de italianos.

Por uma disposição que afeta ainda mais a dignidade humana, introduziu-se a proibição das mulheres estrangeiras em situação irregular de declarar as crianças a que elas deram à luz. Assim, em virtude de uma decisão política, vinda de uma maioria efêmera, as crianças nascidas de mulheres estrangeiras em situação irregular serão durante toda as suas vidas filhos de ninguém. Elas serão tiradas de suas mães e colocadas nas mãos do Estado. Nem o fascismo foi tão longe. As leis raciais instauradas por esse regime em 1938 não privavam as mães judias de seus filhos, nem as obrigava a abortar para evitar que tenham confiscadas suas crianças pelo Estado.

Nós não nos dirigiríamos à opinião pública européia se a gravidade dessas medidas não fosse tal que ela supera as fronteiras nacionais e não exigisse uma reação responsável de todas as pessoas que acreditam em um humanismo comum. A Europa não pode aceitar que um dos seus países fundadores retroceda a um nível primitivo de vida em comum, em contradição com as leis internacionais assim como com as garantias e a cultura jurídica sobre as que se fundamenta a construção política européia.
É do interesse – e tem a ver também com a honra – de todos nós europeus que isso não aconteça.

A cultura democrática européia deve tomar consciência da patologia que vem da Itália e se mobilizar para impedir que isso se expanda pela Europa.
Cada um de nós deve escolher a melhor forma de se manifestar e de se fazer valer sua oposição.”

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